O cheiro de ar parado há muito
tempo não o incomodava. Era revigorante. Passa a mão na parede de pedras
encaixadas e observa o lugar. Ainda havia luz da porta, então sua visão ainda
possuía cores, embora mais ao fundo, onde a luz não chegava, o preto e o cinza
começavam a dominar. Ele via onde não havia luz, mas não havia surpresa nisso.
Todos os anões viam.
Passa a mão na barba bem cuidada, os
fios loiros bem cuidados e presos com anéis de ferro, ouro ou prata, formando
uma intrincada trança. Ele tinha um metro e trinta de altura e possuía um
peitoral largo e braços e pernas grossas. Quase que totalmente recoberto por
uma pesada armadura de um metal escuro. Uma armadura de batalha completa, mas
sem o elmo.Seu escudo, preso firme ao braço esquerdo, era feito de um metal
mais claro. Como se fosse feito de prata. Suas armas traziam a mesma cor da
armadura. Na sua mão direita, um machado recoberto com com uma fina camada de
gelo. Runas azuladas brilhavam em sua lâmina, e o símbolo que estava estampado
no peitoral da armadura e no meio do escudo também encontrava sua vez no meio
do machado: o desenho de uma nuvem e um raio. De sua cintura, pendia um pesado
martelo, do mesmo metal negro e com o mesmo símbolo, mas sem as runas que
destacavam o machado. Nas suas costas, uma besta, a única coisa de madeira que
parecia carregar. Levava também uma mochila com algumas runas inscritas e que
tinha um especto de cheio.Tinha os olhos cinzentos como aço, e trazia um leve
sorriso no
rosto.
- Trabalho porco. - Ainda encarando as
pedras. - Nitidamente é trabalho humano. Maldito o dia que eles começaram a
lapidar pedras. Completamente incapazes de construir algo decente... - E
avança, ainda resmungando, sem preocupação com o barulho. Era mais silencioso
do que se esperaria de alguém vestindo tanto metal, o que mostrava que era um
guerreiro experiente, ao se mover sem problemas aparentes.
Assim que sai do hall de entrada
da ruína, a escuridão é total, e sua visão fica completamente em preto, branco
e tons de cinza. O cheiro de mofo ficava mais forte, e as teias de aranha,
muito mais frequentes. Olha um tanto quanto ressabiado para elas, mas pareciam
normais. Detestava aranhas desde a vez que uma aranha de quase três metros
havia roubado um antigo companheiro de aventuras. Havia pego o martelo na
ocasião. Ele tinha sido o presente para um amigo, feito por ele. Um Mestre
Armeiro Anão, pelos deuses! E aquele maluco havia morrido para uma simples
aranha. Quem diria que os humanos eram tão frágeis. Somente algumas picadas de
uma aranha gigante e ele fora ver os deuses. Nada mais justo que o forjador do
martelo o carregasse depois da morte do amigo.
Afasta os pensamentos enquanto
vasculha sala por sala. Algumas portas estavam podres e só precisavam de uma ou
duas marteladas para cederem completamente, mas não via nada de útil. Diversos
restos do que talvez tivessem sido pergaminhos. Um símbolo se repetia com certa
constância. O símbolo do Destino. Havia algo de estranho no lugar. O Destino
era bondoso, mas aquele templo em específico parecia abandonado há séculos. Uma
época onde os Elfos de Dulbien não haviam atacado. Uma época antes da Guerra
das Sombras. Pelos deuses! Esse templo poderia ter milênios de idade. Ele passa
a mão na barba. Havia conseguido chegar a essa conclusão simplesmente porque
era um Mestre Anão. Tinha consciência de que era um Mestre Anão. Armeiro ainda
por cima. Algo não cheirava bem. Ele vasculha a última sala, mas não encontra
nada. Até que olha para a estátua.
Não era trabalho humano. Era bem
feito demais. Mas seu olhar crítico, como todo o Mestre Armeiro Anão, havia
detectado falhas. Enfeites desnecessários. Um excesso de frescura. Trabalho de
elfos. Sua intuição anã lhe dizia que havia algo de estranho na estátua. Seus
olhos treinados por décadas entre os anões lhe diziam que algo de errado não
estava certo. Ele sorri com o pensamento. Retira a espada da mão da estátua.
Algo com runas elegantes e finas. Trabalho elfo. Elfos tinham Mestres Armeiros?
Ele afasta novamente o pensamento. Era perigoso se aventurar sozinho por isso.
Sempre divagava.
A estátua se move, e sua mão
busca o machado: o adamante de sua composição o deixava perfeito para lutar
contra estátuas. Raras eram as que não se feriam com ele. Coloca o escudo na
frente do corpo, preparando-se para receber a pancada e derrubar o oponente com
um contragolpe, mas ela simplesmente se afasta, enquanto um mecanismo
completamente silencioso vai mostrando uma escada descendo, onde antes
descansava a estátua.
Arisco, como todo Mestre Armeiro
Anão, ele passa o machado no momento em que algo aparece, subindo a escada
outrora oculta.
- Filho da puta! - A voz era
melodiosa, não humana de alguma forma, mas sem o belo tom grave encontrado
entre os anões. Estava mais para o afeminado tom de voz élfico, mas não tão
fino. Ulfric, o Mestre Armeiro Anão, olha antentamente para o recém chegado.
Possuía os olhos totalmente brancos, cabelos escuros e um físico constituído,
embora distante da montanha de músculos que ele era. Concessão: colina de
músculos. Ele havia desviado como que por instinto do golpe, suas mãos logo
brilharam com um fogo que não parecia feri-lo. Pequenas esferas de luz o
seguiam e só agora iluminavam o anão em sua couraça escura. Seus olhos se
estreitaram quando viram as runas no machado, na armadura e no escudo, em um
conjunto perfeitamente harmonioso, o trabalho de um Mestre. Armeiro Anão, não
podia esquecer nunca.
- Pelas barbas do Profeta! - Sua
voz era grave, linda obra dos deuses. A voz de um anão. - Mago, você é herói ou
vilão? - A postura dele já não era mais tão agressiva, mas estava pronto a
acertar o mago com o machado, caso houvessem gestos ou palavras complexas.
O sujeito pareceu confuso por um
momento, mas sua voz vinha carregada de auto-confiança.
- Não sou um mago, mas posso me
considerar um herói.
- Palavra de anão, meio-elfo?
- Não sou um meio-elfo! Sou um
suli!
- Palavra de anão, mago?
- Palavra de anão... - O sujeito
parecia vencido pelo cansaço, mas trazia um sorriso no rosto.
- É o seu dia de sorte, mago! Eu
preciso de um companheiro de aventuras. Sou um mercenário conhecido por ser um
Mestre Armeiro Anão. Posso te fazer armas e armaduras com desconto! E você pode
me fazer itens mágicos que não sejam armas e armaduras. - Ele sorriu,
satisfeito consigo mesmo. - Vamos para a cidade procurar trabalho. Aparentemente
já resolvemos nosso primeiro caso. Você pegou o cetro mágico?
- Ah... - Ele vasculhava em sua
mochila até que pegou um cetro de ouro finamente trabalhado, com o símbolo
sagrado da Deusa da Morte. - Esse?
- Esse mesmo! - Ele gargalha.
Agora tudo ficaria mais divertido. - Vamos receber nossa recompensa!
Ambos saem do templo, com o anão
reclamando da arquitetura e do caminho e do céu e do que mais pudesse colocar
os olhos. A cidade era a uns dois dias de caminhada, nada demais para
aventureiros consumados.
- Eu também conheço um sátiro que
é um bardo... - diz o Suli Feiticeiro.
- Ótimo! Só precisamos de um
ladrão e de um clérigo!
E o mundo ainda irá chorar por
causa desse encontro.
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